15 de abril de 2018

#Conto 3 - O que nos resta é o fim


Por mais que se andasse, a vista era sempre a mesma. Nós já não sabíamos em que ano estávamos. O tempo não parecia passar mesmo que as pessoas morressem cada vez mais a minha volta. O céu era sempre escuro e o sol não brilhava desde o cataclismo. Agora ele era apenas um ponto negro no céu que alguns especuladores juravam estar cada vez maior. De qualquer forma, não conseguíamos contar os dias. Acho que era porque, no fundo, não queríamos saber quantos dias ainda nos restavam para sofrer esse martírio.

Quando me deslocava de algum lugar, a única coisa que encontrava eram campos queimados e destroços negros das construções que não resistiram aos abalos da devastação. Muito pouco se resistiu e as pessoas que ainda vagavam por aí acabavam sucumbindo. Não havia mais lembranças do que o passado já foi alguma vez. Comida e água eram escassas e alguns matariam fácil por elas. Além do mundo, os corações humanos também estavam destruídos. Não havia mais sensatez, só desespero em viver.

Minha mãe me contou várias histórias sobre como o fim do mundo era prometido tantas e tantas vezes, que eles acharam que dessa vez também era uma mentira. Sempre era. Mas o fim realmente veio, mesmo que o mundo por si só não tenha acabado. Só a humanidade que realmente sofreu. O mundo sempre enfrentou coisas desse tipo, e ainda enfrenta. Logo a natureza tomaria tudo que era dela, pois havia castigado os humanos pelos seus atos devastadores. Ela sempre voltava tão qual sempre fora. Era o que minha mãe me contava sobre as coisas que lia em suas revistas científicas.

Mas ela já se fora de qualquer modo. Morreu em meus braços e isso já faz algum tempo. Nem todo seu sorriso conseguiu mantê-la viva por mais algum tempo. Ela dizia que tínhamos o suficiente para sobreviver, embora isso tenha sido porque ela deixou de comer várias vezes para me sustentar. Eu era bem mais novo e não tinha consciência desse sacrifício. Poderíamos ter vivido um pouco mais de tempo juntos para morrermos tão logo. Não ia fazer diferença. Não há nada para se fazer em um mundo que só tenha restos e um bando de loucos que não estão dispostos a cooperar para sobreviver. Entretanto, eu não queria que a morte da minha mãe tivesse sido em vão. Mas já estava farto dessa vida sem rumo e sentido. Não havia destino algum se não morrer. 

Tudo o que eu podia fazer era vagar sem rumo, como se isso fosse fazer algo especial acontecer. Mas mesmo esperando por isso, eu sabia que era improvável. Embora talvez o mundo agora vivesse em torno da improbabilidade. Afinal, a coisa que menos se acreditava que aconteceria, aconteceu. Meu estomago estava dando sinal da fome que me assolava algum tempo. Eu comi minha última barrinha fazia muito tempo. Talvez uns dois dias. Se eu não encontrasse algo ou alguém logo eu também morreria. Fazia muito tempo que eu não via uma pessoa viva. O que eu faria se fosse o último ser humano?

Uma luz despontou no horizonte. Talvez fosse alguém que tenha acendido uma fogueira. Fui em direção a ela, mesmo sabendo que haveria chance de não serem pessoas amistosas. Ir de encontro a provável morte ou uma quase impossível redenção. A luz estava muito longe e eu já havia perdido todas as minhas forças. Eu andava, mas parecia que não me aproximara nenhum pouco. Minhas pernas ardiam e meu pulmão queimava. Comecei a ver alguns vultos envolta da esfera luminosa e de lá veio um som abafado que pareceu um estalo. Eu parei abruptamente. Senti meu corpo se aliviar. Eu caí de joelhos e minha visão estava turva. Espero que minha mãe me perdoe caso eu acabe morrendo, porque eu acho que é o que está... acontecendo…


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